domingo, 19 de junho de 2016

Sociedade do Medo - A Cultura Apavorada (Parte 2)



"Tenho medo de outras pessoas."
"Mas Mimi, outras pessoas são só como você!"
"É por isso que tenho medo delas!"

Fala-se muito de que vivemos em uma “cultura” que “é” de um ou de outro modo, de acordo com o viés com que cada um se sente mais afetado. Os significados se amontoam, gerando um resultado final que levaria qualquer um de fora a nos perguntar porque sequer saímos das nossas camas de manhã para enfrentar tamanho pesadelo “cultural” cotidiano. Eu considero esse fenômeno, esse amontoado de “terrores”, uma extensão do medo que rege a civilização, que desta vez está se fortalecendo em um novo aspecto de nossas vidas – o aspecto de nossos símbolos, significados, e, principalmente, de relações pessoais. Embora não seja exatamente (ainda) uma “cultura”, chamo esse fenômeno de “Cultura do Medo”. 

Continuo aqui a análise da Sociedade do Medo, em que vivemos. Caso ainda não tenha feito, você pode ler a parte 1, "Morte e Civilização", aqui.

Parte 2: A Cultura Apavorada

"O inimigo é o Medo. Nós pensamos que é o ódio, mas é o medo." (Gandhi)

O medo há tempos tem dominado a sociedade e direcionado a civilização, mas isso não significa que ele sempre dominou a cultura, pelo menos não por dentro, em suas estruturas simbólicas e linguísticas. Tal está, entretanto, acontecendo nas gerações atuais. Nossa cultura estaria se transformando em uma nova cultura, amedrontada, devido à ação coletiva e conjunta de uma multidão cada vez maior de indivíduos agindo com base nos imperativos do medo, através da propagação do “sentimento de terror” e da desconfiança constante. Uma multidão de indivíduos agindo e pensando de modo semelhante não é suficiente para considerar algo como uma cultura, mas é o primeiro passo para esse comportamento se solidificar como uma cultura, muito em breve. 

O que seria este “sentimento de terror” que citei? Além de ser o objetivo maior de grupos terroristas, é o comportamento individual retratado no “batedor receoso” desse trecho a seguir, escrito por Epiteto, filósofo estóico da antiga Grécia (que também nos dá um ótimo exemplo de como não ser sujeito ao medo constante):

Suponha que você envie um batedor para averiguar Roma. Não se costuma enviar um batedor receoso que, assim que ouve um barulho, ou vê uma sombra, corre de volta assustado e diz “O inimigo está próximo. ” Então agora, se você vem e nos diz, “As coisas estão terríveis em Roma; a morte é terrível, a calúnia é terrível, a pobreza é terrível; corram, pessoas boas, pois o inimigo está próximo. ” Nos responderemos, vá te embora, batedor, e profetize para si mesmo; pois nossa única falha foi ter enviado tal batedor. Diógenes foi enviado antes de você, mas ele nos contou outras notícias. Ele falou que morte não é um mal, posto que sua base é o nada; e que a calúnia é apenas o barulho de homens loucos. E que relato este espião nos deu da dor, do prazer, da pobreza? Ele diz que estar nu é melhor do que com uma túnica rosada; que dormir sobre o chão nu é dormir na cama mais macia; e dá provas de tudo que diz pela sua própria coragem, tranquilidade, liberdade, e principalmente, por um corpo robusto e sadio. “Não há inimigo por perto”, ele diz; “Tudo é paz profunda. ” Como assim, Diógenes? “Olhe para mim”, ele diz, “estou eu machucado? Estou ferido? Tive de fugir de alguém?”. Este é um batedor que se vale a pena confiar. Mas você veio, e nos contou fábula após fábula. Volte lá e olhe com mais cuidado, e sem medo dessa vez. 

“Medo estatístico” e o “perigo em potencial”

"O Grito", de Edvard Munch.
Será que são os dois homens no canto inspirando o terror?

Voltando ao tempo presente. Estamos entrando em um momento de intensificação do medo coletivo: querem transformar todos nós em “batedores receosos”. Este direcionamento vem sendo criado a alguns anos, percebido no crescimento dos discursos baseados em medo, de todos os lados do espectro político-ideológico, com diversos e constantes episódios da mídia - e consequentes fatos midiáticos – dando muito combustível à esse motor. Com episódios recentes como o “estupro dos 33” ou o ataque de Orlando, esta intensificação se tornou bastante óbvia, tal como o ataque de 11 de setembro de 2001 fortaleceu o mesmo medo em elites norte-americanas. Com as olimpíadas chegando, a possibilidade de um ataque terrorista real em território brasileiro pode empurrar tudo isso à um patamar ainda maior, se realizada. Mas me adianto, esse é assunto para a parte 3.

No caso do estupro coletivo, por exemplo, existiram duas “subculturas do medo” batalhando por atenção e controle das nossas mentes. Não são cada uma, uma cultura do medo em si, e tampouco aqui estou dando crédito ao conceito de “cultura do estupro”. Estou falando de duas culturas (ou linhas de pensamento), distintas, mas sinérgicas, de relativização da culpa. Sinérgicas porque, ao contrário do que pregam, estas "formas-pensamento" dependem uma da outra para sobreviverem. A primeira delas foi abordada de maneira sensacional neste vídeo ótimo do Omário, do canal Morgatório do Pássaro. Esta “cultura de relativização da culpa” ocorre quando alguém expressa uma falta de simpatia por uma vítima que se colocou em situação de risco,por ter se colocado em tal situação. Ainda que esta pessoa não tire a culpa e o repúdio do agressor/estuprador, esta linha de pensamento de fato pode decair, no futuro, para uma verdadeira cultura do estupro, como a que existe em alguns países do oriente médio. Vejam o vídeo do Omaro para entender em detalhes.

Mas tal decadência não ocorre em isolamento, e meu objetivo aqui é focar o modo de pensar antagônico (e simbiótico) a este. A outra linha de pensamento de relativização da culpa é perpetrada pelo outro lado deste debate, que segue exatamente o comportamento apontado em um outro artigo aqui do blog, traduzido por mim e escrito por Feral Faun, “A Ideologia da Vitimização”. Neste caso, ao invés de atribuir a culpa aos agentes de fato do crime, defensores desta linha de pensamento empurram essa culpa à uma esfera existencial diluída, genérica, simbólica, “cultural”, aparentemente onipresente em cada trejeito, palavra ou expressão. É nada mais nada menos que a mesma derrota que o movimento ambientalista recebeu com a subida do “ambientalismo de pequenas mudanças de cada um”. Assim o agressor deixa de ser apenas um agressor, alguém que a polícia pode perseguir, que alguém treinado pode se defender, que uma pessoa atenta pode evitar. O agressor passa a ser uma representação física e temporária, “fruto do seu meio” (e por isso, alguns destes ainda diriam, paradoxalmente, quase que “perdoável”); representação essa de um mal maior, inatingível, com qualidades quase que sobrenaturais (onipresente, onipotente), atuante em “todos” os níveis da sociedade e em “todas” as relações – visão essa que irá rebater de volta, pois passa a enxergar qualquer indivíduo em um potencial agressor: “se existem casos isolados de fulanos fazendo tal ou qual atrocidade que ninguém tolera sequer olhar - isso é porque todos nós em 'algum' nível ‘aprovamos’ isso - então meu próprio companheiro pode me atacar a qualquer hora! - principalmente se ele não concordar com esse meu raciocínio”. Veremos um exemplo desse raciocínio mais adiante.

Tal linha de pensamento se vê em frases como “todo homem é um estuprador em potencial”. Essa frase pode ser examinada, e rejeitada, por inúmeros caminhos. Vou aqui abordar a relação desta linha de pensamento com o medo e nossa sociedade do medo, pois ela serve de exemplo crucial para todos os outros pensamentos que o feminismo moderno (ou "de 3ª onda") prega, fortalecendo a cultura do medo, usando de generalizações e desconfiança, seja sobre homens, sobre relacionamentos, sobre violência doméstica, ou qualquer estatística, fabricada ou real.

Como apontado no vídeo do Omaro, sim, em termos lógicos, isso é um fato: numa rua, à noite, uma mulher sozinha pode tomar cuidado ao ver um homem, imaginando que pode ser um potencial agressor. Porém, também é um fato de que há um “potencial” estatisticamente e realisticamente muito maior de que todo homem seja alguém “não-perigoso” “em potencial”, ou ainda mais que isso: um amigo em potencial, um amor em potencial, um conhecido simpático em potencial, um parceiro de trabalho em potencial; ou alguém que, “potencialmente”, não pensaria duas vezes em se sacrificar, sem querer nada em troca, por outra pessoa ou por essa mesma mulher. Contudo, esta linha de pensamento que estou criticando prefere se focar no “perigo em potencial”, e além disso, o faz de forma não combativa, mas submissa – ao invés de se preparar a enfrentar o possível perigo, se recolhe eternamente no pânico (por incrível que pareça, e isso abordarei em mais detalhes na última parte dessa série).

Como um exemplo de forma combativa, há também, felizmente, movimentos de mulheres que, ao invés de relativizar a culpa para todos os homens, se preocupa mais e prioritariamente em desenvolver habilidades de autodefesa, posturas atentas, e responsabilidade real sobre a própria segurança. Evidente que esse caminho só é possível se você NÃO aceitar que o mundo inteiro quer apenas e exclusivamente te fazer mal, pois em tal caso a defesa seria fútil. Esta noção de responsabilidade pela própria segurança é algo que, é importante notar, a grande maioria dos homens percebe desde cedo que precisa cultivar para si. Mas voltaremos a esse ponto mais tarde. 

Em poucas palavras, o medo saudável é aquele que te ajuda a enxergar riscos no ambiente ao redor, e a evitá-los. Enxergar riscos em todo local não é apenas medo, é paranoia. Pensar riscos como forças onipresentes e inescapáveis é pior que paranoia, é submissão. É uma submissão interior, psicológica, a qualquer perigo que possa se apresentar na realidade, antes desse se apresentar, pois é, desde o começo, desistir de se proteger, porque compreende que qualquer defesa seria fútil. E indo além, não se responsabilizar pela própria segurança, em qualquer que seja o momento, época, ou situação social, agindo de modo contrário à própria segurança (às vezes, “por birra”), é mais que submissão, beirando a própria idiotice (a condição intelectual real, não a ofensa, e uso aqui o termo sem pretender ofender, claro). 

Cenário de histeria em massa 

"Bruxas"/"O Sabbath das Bruxas" de Goya

Nos últimos dias tive a sorte (ou azar...) de ver nas redes sociais dois exemplos didáticos perfeitos das consequências desta paranoia moderna de relativização e diluição da culpa. Um exemplo partindo de uma mulher, e outro de um homem. Ambos levando o atual discurso do medo aos seus limites lógicos (aliás, ilógicos).


Nesta moça se percebe claramente como a amplificação do caso recente, na mídia e nas redes sociais, alterou sua percepção sobre seu marido. Veja bem, ela mesma diz que ele jamais foi agressivo, nem com ela ou com a filha. Sempre tiveram uma vida sexual saudável e feliz, por 15 anos! Porém, segundo ela, o simples fato de ele não ter abraçado imediatamente a um exato discurso, a faz simplesmente ignorar todos os anos de convívio que tiveram juntos, estabelecendo relações de liberdade, respeito e confiança. E tenho a impressão que mesmo que o marido adotasse o atual discurso, com filtros de facebook e postagens "politicamente corretas" de "mea culpa", o cenário seria o mesmo (já que ela já suspeita de hábitos banais dele, e também porque não são poucos nem inesperados os casos de “lobos vestidos de cordeiro” nessas situações, e ela poderia do mesmo modo não confiar nas palavras dele, ainda mais se forem bonitas demais ou não parecerem sinceras – como a maioria dos rapazes linkados acima não me parecem sinceros).

Inclusive, pode se perceber claramente que a moça está agora, por causa do medo, muito mais submissa e aprisionada perante a vida. Veja bem: não foi uma ameaça de estupro à sua vida, não foi o caso de estupro coletivo reportado, não foi qualquer atitude do marido; foi apenas o medo, pura e simplesmente medo, aumentado pelas mídias e redes sociais, que está destruindo as liberdades dessa mulher. Este relacionamento também está certamente caminhando rumo ao colapso, com possíveis acusações contra o marido no caminho, graças a todo este medo (visto que, em nível inconsciente, ela já está procurando uma “ação” da parte do marido para justificar seu temor e uma separação real; e com esta postura mental, o homem pode ser um verdadeiro santo abençoado, que ela cedo ou tarde irá encontrar – ou causar – algo que possa ser visto no mínimo dubiamente). O pior de tudo é que, tendo em vista que isso provavelmente foi postado em um grupo em uma rede social, ela certamente não está sozinha nessa forma de paranoia – e provavelmente teve sua paranoia apoiada e fortalecida pelas mesmas pessoas que se dizem lutar pelas mulheres ou pela liberdade de vivências. Enquanto que, na realidade, esta pessoa precisa de apoio terapêutico real, e um apoio coletivo que a ajude a se livrar do medo, não se afundar nele.

Isto é um exemplo didático de como um episódio de histeria em massa surge, se desenvolve, e se alastra, visto em nível individual. Isso não é uma ofensa, histeria em massa (ou histeria coletiva) é uma real condição social e psicológica que pode acometer uma população, com muitos casos bizarros e assustadoresregistrados (inclusive recentes). Atentem aos links para saber mais sobre esse assunto importantíssimo e largamente ignorado. Vamos ao segundo exemplo.


Este jovem está preocupado com uma situação recorrente, pois não quer ser tomado como vilão apenas por conta de seu sexo (apesar de, nas entrelinhas, aceitar que tal tipo de julgamento seja feito). O crucial aqui é este exemplo prova que esta cultura do medo deixa as mulheres em maior risco. Pois se todo rapaz “de bem” (ou seja, alguém que só está cuidando da própria vida e não quer cometer violências contra ninguém, e poderia muito bem decidir proteger alguém caso necessário e dentro de suas capacidades) se preocupar em ficar longe das mulheres andando nas ruas, por medo de as assustar, elas estarão mais isoladas, e, consequentemente, alvos mais fáceis de possíveis ataques reais. Em uma realidade paralela, ou mesmo no passado da nossa realidade, onde a cultura do medo não reinasse desse modo, eles poderiam até estar caminhando juntos, conversando, se protegendo mutuamente. Novamente, esse tipo de situação que o rapaz aponta não é raridade. E a cada dia que passa onde ouvimos “potencial estuprador” repetido de novo e de novo, menos desses casos vão resultar em duas pessoas caminhando juntas se protegendo mutuamente.

O que quero dizer é que esta linha de pensamento separa as pessoas dentro de uma comunidade. Torna encontros com potenciais parceiros de sobrevivência (como humanos saudáveis normalmente são - posto que somos uma espécie social e cooperativa por natureza, e obrigatoriamente) em situações de terror e medo, onde qualquer soluço pode ser mal interpretado e piorar a situação. O medo, em excesso, destrói a capacidade de confiança mútua e cooperação. Destrói relações e poda liberdades. Nos deixa reféns exatamente daquilo que temíamos tanto, mesmo que tal perigo seja apenas psicológico. E ainda nos deixa vulneráveis a outros perigos.

- - -
Concluindo a parte 2 desta série, resta dizer que este fenômeno, a Cultura do Medo, está apenas preparando o terreno para uma mudança no modo de operar da civilização moderna, uma mudança que o sistema talvez já perceba como imprescindível para postergar seu colapso por mais algumas décadas. Falaremos dessa mudança na parte 3, aqui.

4 comentários:

  1. Em tempo: este texto aborda superficialmente minha posição sobre o feminismo, com potencial, portanto, de causar polêmica. Antes que me façam comentários aqui nesse sentido, peço que leiam meu texto sobre o feminismo antes (ou talvez prefiram comentar lá).

    http://vida-nos-bosques.blogspot.com.br/2014/03/o-feminismo-e-permissao-para-discordar.html

    ResponderExcluir
  2. Complementando o que foi dito sobre medo, o feminismo moderno, de 3ª onda, vem usando cada vez mais tal emoção como ferramenta de crescimento (nem sempre de modo inconsciente). Evidente que, amedrontando aquelas que pretendia proteger, o movimento consegue acumular poder e seguidores, mas à custa da saúde psíquica das mulheres que pretende defender. Isso pode ser dito sem entrarmos no debate de se o feminismo é “bom” ou não - seu modo de operar atual, qualquer que seja a "validade" de sua causa, não se justifica. Alguns exemplos disso:
    - Não passa uma semana sem uma nova moda entre as feministas da internet, com a qual criticam indiscriminadamente homens e se amedrontam coletivamente de volta à posição de vítima. Como exemplo há a hashtag recente "elenãotebate", com a qual as moças são convidadas a procurar ativamente detalhes ruins do relacionamento, e simbolicamente elevá-los à condição de agressão à mulher. Todo relacionamento tem seus problemas, toda pessoa tem suas imperfeições e momentos de crise. Se você não gosta dos piores momentos do seu parceiro, você não precisa (ou merece) da companhia do mesmo em seus melhores momentos – e basta terminar o relacionamento. Faz parte da experiência humana e faz parte do amadurecimento de todos evoluir nossos relacionamentos a partir dessas situações. E, principalmente, é essencial que as mulheres também assumam responsabilidade quando o mau humor do parceiro for de fato culpa delas, ao invés de associar qualquer evento de mau humor à um "machismo" ou uma "tendência a agressão" prestes a explodir.
    - Não é raro ouvir que feministas reconhecem (e já ouvi isso de várias), que, após participarem de uma reunião feminista, elas "perceberam finalmente" terem sido vítimas de estupro um dia, e "nunca tinham percebido isso antes". Evidente que o conceito de estupro precisa ser um bastante solto para que alguém sofra um, enquanto consciente e fazendo sexo consentido, e não perceba. Evidente também que tais reuniões acontecem com a presença exclusiva de mulheres (e feministas). Note a importância em deixar os homens de fora para não ouvir o lado deles – e permitir que se fale deles o que se desejar sem que estes possam se defender. Justificam isso com uma ideia tola de "espaço seguro", como se todos nós fôssemos agressores selvagens incapazes de discutir adequadamente problemas que ocorrem entre os gêneros. É óbvio para qualquer um que queira ver que todo este "espaço seguro" não passa de uma “câmara de eco”, onde as ideias mal-acabadas de umas fortalecem as ideias mal-acabadas de outras, distanciando os gêneros e dificultando cada vez mais o debate, ao mesmo tempo em que aumentam consideravelmente o "volume" do medo - e do ódio aos homens - entre todas as mulheres presentes.

    ResponderExcluir
  3. - Não existe uma cultura do estupro em nossa sociedade ocidental moderna. Nisso vale citar que, nos EUA (de onde este conceito, assim como muitos outros conceitos feministas, foi importado), a própria Rede Nacional de Assistência a Vítimas de Estupro, Abuso e Incesto, (ou RAINN, na sigla em inglês), que está a décadas combatendo a violência contra as mulheres, já veio a público diversas vezes pedir o fim deste conceito, deixando claro que estupro não é um ato fortalecido culturalmente nos países ocidentais, pelo contrário, é severamente odiado e punido, e se trata de um ato de um indivíduo desviante. Disse, ainda, que este conceito prejudica o combate aos estupros reais, pois gera uma flexibilização do conceito e um consequente aumento de acusações duvidosas ou falsas, e prejudica a vida das mulheres no geral, pois cria um clima de paranoia. Vejam:
    https://www.rainn.org/news/rainn-urges-white-house-task-force-overhaul-colleges%E2%80%99-treatment-rape
    http://time.com/30545/its-time-to-end-rape-culture-hysteria/
    Aliás, o próprio fato de que há uma onda fortíssima de pessoas "em luta contra a cultura de estupro" mostra que não há tal cultura. Há, certamente uma "cultura que diz que existe a cultura do estupro", mas que jamais estaria coexistindo desse modo, com tanta força e alcance, caso realmente existisse uma verdadeira cultura do estupro. E é incrível que quanto mais pessoas se manifestam contrários à “cultura do estupro", maior se torna a histeria e o pânico, enquanto que ao mesmo tempo mais evidente é o fato de que tal “cultura do estupro” é inexistente.

    Chega de tudo isso.
    Mulheres, abandonem o domínio do medo.
    Feminismo, abandone o medo como ferramenta de dominação ideológica. Como tanto promete, trate de realmente empoderar as mulheres, ao invés de amedrontá-las até o ódio (aos homens) ou o isolamento (entre os gêneros).

    ResponderExcluir
  4. (este comentário deveria ter entrado entre os dois anteriores)

    - Existe também agora a moda das "fanfics", histórias criadas, fictícias, mas conscientemente elaboradas e divulgadas como reais. O termo foi tomado das comunidades de fãs de obras de ficção. Nas fanfics, coisas horrorosas acontecem com alguém, (normalmente o narrador) que corroboram a cada linha com a visão de um mundo cruel e perpetuamente opressor e perseguidor de mulheres. Diversos casos já foram pegos no flagra como acusações falsas (pois câmeras de vigilância ou testemunhas de locais públicos puderam comprovar que os fatos relatados não aconteceram). Os ideólogos que escrevem estas fantasias justificam-se dizendo que "se não aconteceu, poderia ter acontecido" ou "se foi acusado injustamente, pelo menos serve para refletir sobre a vida das mulheres", ignorando completamente as consequências nefastas que tais histórias causam na vida de pessoas inocentes (como demissões, prisões, espancamentos, ou morte por linchamento); ignoram, ainda, que uma pessoa falsamente acusada de um crime jamais tirará dessa experiência que "deve então tomar mais cuidado para não cometer o crime real", pelo contrário, todas as pessoas envolvidas e enganadas passarão a desconfiar de novos relatos (no mecanismo básico apontado pela tradicional fábulo de "Pedro e o Lobo").
    A absurda e horrenda arte de fabricar fanfics também mostra como o ideal pós-moderno não se preocupa em se afastar da realidade dos fatos, preferindo julgar que "cada um tem sua realidade", em uma nítida priorização da opinião própria sobre o mundo acima da realidade própria do mundo.
    Tudo, claro, com o objetivo de incutir o medo que alastra sua ideologia de desconfiança, paranoia, e pânico.
    Este é o caminho da falta de diálogo (pois, se cada um vive em uma realidade diferente, como duas visões podem dialogar?) e da prepotência totalitária (paradoxalmente, quando consideram que só uma "realidade subjetiva" tem direito de manifestar-se, taxando qualquer outra visão de mundo, por mais dócil que seja, como algum tipo de discurso de ódio ou preconceito herdado velado). É apenas na realidade comum que todos compartilhamos que pode existir verdadeiro aprendizado (pois somos apresentados com o que não conheciamos), a verdadeira humildade (pois somos forçados a reconhecer erros), e verdadeiros relacionamentos (pois é no contato de duas subjetividades, que acontece por meio da realidade, que pontes reais se constroem). A realidade comum é a base da racionalidade científica e da capacidade de se colocar as próprias convicções à prova da realidade.
    Além disso, essa visão infantil e imatura da vida, somada à adoração do medo, mostra um claro tiro no pé: se, "cada um vive na sua realidade subjetiva", porque diabos tais pessoas escolhem viver em realidades tão horrendas, com tamanhas ameaças "potenciais" a partir de cada cidadão contemporâneo? Se eles vão assumir suas insanidades como realidades, porque não escolhem uma insanidade menos hostil com a qual (tentar) enxergar o mundo? Novamente, se percebe que são pessoas que escolhem viver e cultivar o medo, pelo medo (não por igualdade ou justiça, como tanto pregam... estas eles seriam incapazes de reconhecer quando vissem, e capaz que julgassem como preconceituosas por não serem como eles esperam que seja).

    ResponderExcluir